GETCrim: Grupo de Estudos de Temas sobre Criminologia - GDUCC: Grupo de Diálogo Universidade, Cárcere e Comunidade - Faculdade de Direito da USP.
7.5.07
O GETCrim mudou de sala novamente - nova sala 306 I, 3º intermed. prédio anexo
Mudamos novamente de sala, portanto, para uma onde possamos continuar nos sentando em um círculo sem excluir ninguém da conversa, todos com igual possibilidade de fala.
Sala 306 I, 3º andar intermediário, prédio anexo.
Compareçam!!!
5.5.07
O outro lado...
É positivo o projeto que prevê o monitoramento eletrônico de condenados e presos provisórios?
NÃO
Foco distorcido
GUNTHER ALOIS ZGUBIC e JOSÉ DE JESUS FILHO
A COMISSÃO de Constituição e Justiça do Senado acaba de aprovar dois projetos estabelecendo o monitoramento eletrônico de condenados e presos provisórios.
Por sua vez, tramitam na Câmara três projetos versando sobre o tema. Todos falam em diminuição da população prisional. No entanto, tais proposições não visam alternativas à pena privativa de liberdade, mas sim alternativas à própria liberdade.
Os projetos pretendem o uso de dispositivos eletrônicos em condenados que cumprem pena nos regimes aberto e semi-aberto, no livramento condicional e em presos provisórios.
Ora, nas três primeiras situações, os investigados ou condenados já gozam da liberdade, ainda que restringida no tempo e no espaço. A colocação de dispositivos para o rastreamento de seus passos representará, desse modo, um "plus" no controle dos condenados, e não uma alternativa à privação da liberdade tendente a reduzir a superpopulação prisional.
Em nenhum momento o monitoramento eletrônico se apresenta como alternativa à prisão. Ele sempre aparece como acréscimo na privação ou restrição à liberdade. Mesmo quando aplicado aos presos provisórios, ficam excluídos os que praticaram crimes hediondos, com grave ameaça ou com violência à pessoa. E, nesses casos, os juizes já não concedem a liberdade provisória. De modo que não há nenhum benefício com o monitoramento eletrônico. Exceto para a indústria do controle do crime. Para essa, os benefícios econômicos são evidentes.
Mesmo que houvesse mudança legislativa efetivamente dirigida a substituir a pena reclusiva por um "cárcere virtual", ainda assim não é certo que haveria uma desaceleração do crescimento da população prisional.
Para constatar isso, basta recordar que a ampliação do rol de crimes atingidos por penas alternativas não significou diminuição da pena privativa de liberdade, ao contrário, a população carcerária continuou crescendo. De fato, criar alternativas à pena de prisão não atingiu necessariamente os operadores do direito, especialmente juízes e promotores, que continuam refletindo a demanda social por mais punição. Em outras palavras, mais leis não resolvem um problema que é cultural.
Receamos também que o uso de dispositivos eletrônicos em condenados não pare aí, mas que sua aplicação se estenda "ad infinitum", ampliando o controle social. Agora se propõe o uso em condenados; futuramente, nos demais cidadãos. E, claro, sempre sob o argumento de que ninguém está obrigado a usar o mecanismo, mas sem eles fica mais difícil ter emprego, conta bancária e assim por diante.
Se o dispositivo for, como querem alguns, um microchip do tamanho de um grão de arroz inserido por baixo da pele, permitindo até monitorar os batimentos cardíacos e a pressão arterial, ele significará uma invasão da intimidade da pessoa.
Por fim, é importante recordar que tais alterações pontuais com freqüência ferem a sistematicidade do sistema penal. E, nessa década, como na precedente, o Congresso Nacional foi profícuo em bombardear o sistema com leis esparsas e contraditórias, das quais o maior exemplo é a Lei dos Crimes Hediondos.
Por essa razão, esperamos que qualquer alteração venha precedida de ampla reflexão e discussão, ouvindo especialistas e tomando conhecimento das experiências já realizadas em outros países.
Na Inglaterra, por exemplo, houve um recuo no processo de implantação do monitoramento eletrônico ao se perceber que o sistema ainda era falho. Também carecemos de um estudo do investimento necessário, pois ele não se resume à colocação de um chip ou uma tornozeleira.
Se a intenção de aplicar o monitoramento eletrônico é reduzir a superpopulação, e não aumentar o controle e a punição, então qualquer proposta, para ser efetiva, deverá contemplar aqueles condenados no regime fechado.
GUNTHER ALOIS ZGUBIC, 57, é sacerdote católico e Coordenador Nacional da Pastoral Carcerária.
JOSÉ DE JESUS FILHO, 32, é missionário oblato de Maria Imaculada e advogado da Pastoral Carcerária.
Para pensar - publicado na Folha de SP, 04/05/07
É positivo o projeto que prevê o monitoramento eletrônico de condenados e presos provisórios?
SIM
Racionalidade necessária
ALOIZIO MERCADANTE
"O sono da razão produz monstros"
Goya
TRATAR O tema da segurança com racionalidade e equilíbrio tornou-se difícil no Brasil. A opinião pública, chocada com os bárbaros crimes e o clima de insegurança, demanda medidas duras que nem sempre se coadunam com o tratamento comedido do tema. Embora seja natural a revolta que tomou conta da população, nós, homens públicos, temos a delicada tarefa de transformar compreensíveis sentimentos de indignação em propostas conseqüentes para dar resposta eficaz ao grave problema da segurança pública.
Um dos principais pontos a serem atacados, num vasto espectro de medidas, é o sistema prisional. Primeiro, as prisões são dominadas pelo crime organizado. Delas partem ordens dos comandos do crime para afrontar a população e as autoridades.
Em segundo lugar, ao misturarem presos primários de baixa periculosidade com encarcerados perigosos, elas se tornam escolas do crime.
Em terceiro lugar, elas estão insuportavelmente superlotadas. Há cerca de 400 mil presos no Brasil, mas só há vagas para 230 mil. Ademais, temos ao redor de 550 mil mandados de prisão que não podem ser cumpridos.
Com o intuito de dar racionalidade a esse terrível sistema carcerário e diminuir a insegurança da população, conseguimos aprovar na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, por unanimidade, três projetos de minha autoria.
O projeto relativo à separação de presos por graus de periculosidade (réus primários, não perigosos, perigosos e chefes do crime organizado) significa um forte golpe contra o sistema de recrutamento do crime organizado, o qual é realizado mediante ameaças aos réus ainda não associados aos comandos.
O projeto relativo à aplicação de penas alternativas a pequenos delitos, por meio de prestação de serviços à comunidade, permitirá aliviar a pressão por vagas para presos de baixa periculosidade e aumentará as chances de recuperação desses indivíduos.
Inovador, contudo, é o projeto que introduz o monitoramento eletrônico de presos. Baseada na experiência exitosa de países como Inglaterra, Suécia, EUA, México e África do Sul, a proposta, cuja elaboração contou com as oportunas contribuições do governador José Serra (SP) e do senador Demóstenes Torres (DEM-GO, ex-PFL), prevê que o juiz poderá, com a aquiescência do réu, utilizar o monitoramento eletrônico para garantir as condições impostas para o livramento condicional e a progressão para os regimes semi-aberto e aberto.
Além disso, o monitoramento poderá ser usado nos indultos natalinos, garantindo que beneficiários dessa regalia não cometam crimes.
Esse mecanismo deverá ser especialmente útil nos casos de prisão provisória. Existem ao redor de 170 mil presos provisórios aguardando julgamento. Em sua maioria, foram encarcerados porque não tinham "endereço fixo". Ora, o monitoramento eletrônico pode resolver boa parte desses casos, retirando da prisão pessoas em processo de julgamento que não necessariamente precisam estar encarceradas e assegurando vagas nos presídios para os criminosos que devem ficar presos.
Trata-se, assim, de medida que introduz racionalidade e justiça num sistema prisional injusto e ineficiente. Ademais, o monitoramento eletrônico deverá custar muito menos do que a manutenção de presos. Há, porém, críticas ao projeto por parte dos que o consideram estigmatizador. Ora, o uso de pulseiras ou tornozeleiras eletrônicas, facilmente ocultáveis, é alternativa bem menos ofensiva aos direitos individuais do que a privação da liberdade nas masmorras que são nossas prisões.
O projeto do monitoramento eletrônico faz parte do esforço do Senado para dar resposta firme e racional à insegurança das cidades brasileiras. Quando a razão adormece, geram-se monstros, advertia Goya.Temos de permanecer nessa trilha ditada pela razão e a modernização caso queiramos soluções eficazes para a segurança pública. Afinal, de monstruosidades as nossas ruas já estão cheias.
ALOIZIO MERCADANTE, 52, economista e professor licenciado da PUC-SP e da Unicamp, é senador da República pelo PT-SP.