5.5.07

Para pensar - publicado na Folha de SP, 04/05/07

TENDÊNCIAS/DEBATES

É positivo o projeto que prevê o monitoramento eletrônico de condenados e presos provisórios?

SIM

Racionalidade necessária

ALOIZIO MERCADANTE

"O sono da razão produz monstros"
Goya

TRATAR O tema da segurança com racionalidade e equilíbrio tornou-se difícil no Brasil. A opinião pública, chocada com os bárbaros crimes e o clima de insegurança, demanda medidas duras que nem sempre se coadunam com o tratamento comedido do tema. Embora seja natural a revolta que tomou conta da população, nós, homens públicos, temos a delicada tarefa de transformar compreensíveis sentimentos de indignação em propostas conseqüentes para dar resposta eficaz ao grave problema da segurança pública.
Um dos principais pontos a serem atacados, num vasto espectro de medidas, é o sistema prisional. Primeiro, as prisões são dominadas pelo crime organizado. Delas partem ordens dos comandos do crime para afrontar a população e as autoridades.
Em segundo lugar, ao misturarem presos primários de baixa periculosidade com encarcerados perigosos, elas se tornam escolas do crime.
Em terceiro lugar, elas estão insuportavelmente superlotadas. Há cerca de 400 mil presos no Brasil, mas só há vagas para 230 mil. Ademais, temos ao redor de 550 mil mandados de prisão que não podem ser cumpridos.
Com o intuito de dar racionalidade a esse terrível sistema carcerário e diminuir a insegurança da população, conseguimos aprovar na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, por unanimidade, três projetos de minha autoria.
O projeto relativo à separação de presos por graus de periculosidade (réus primários, não perigosos, perigosos e chefes do crime organizado) significa um forte golpe contra o sistema de recrutamento do crime organizado, o qual é realizado mediante ameaças aos réus ainda não associados aos comandos.
O projeto relativo à aplicação de penas alternativas a pequenos delitos, por meio de prestação de serviços à comunidade, permitirá aliviar a pressão por vagas para presos de baixa periculosidade e aumentará as chances de recuperação desses indivíduos.
Inovador, contudo, é o projeto que introduz o monitoramento eletrônico de presos. Baseada na experiência exitosa de países como Inglaterra, Suécia, EUA, México e África do Sul, a proposta, cuja elaboração contou com as oportunas contribuições do governador José Serra (SP) e do senador Demóstenes Torres (DEM-GO, ex-PFL), prevê que o juiz poderá, com a aquiescência do réu, utilizar o monitoramento eletrônico para garantir as condições impostas para o livramento condicional e a progressão para os regimes semi-aberto e aberto.
Além disso, o monitoramento poderá ser usado nos indultos natalinos, garantindo que beneficiários dessa regalia não cometam crimes.
Esse mecanismo deverá ser especialmente útil nos casos de prisão provisória. Existem ao redor de 170 mil presos provisórios aguardando julgamento. Em sua maioria, foram encarcerados porque não tinham "endereço fixo". Ora, o monitoramento eletrônico pode resolver boa parte desses casos, retirando da prisão pessoas em processo de julgamento que não necessariamente precisam estar encarceradas e assegurando vagas nos presídios para os criminosos que devem ficar presos.
Trata-se, assim, de medida que introduz racionalidade e justiça num sistema prisional injusto e ineficiente. Ademais, o monitoramento eletrônico deverá custar muito menos do que a manutenção de presos. Há, porém, críticas ao projeto por parte dos que o consideram estigmatizador. Ora, o uso de pulseiras ou tornozeleiras eletrônicas, facilmente ocultáveis, é alternativa bem menos ofensiva aos direitos individuais do que a privação da liberdade nas masmorras que são nossas prisões.
O projeto do monitoramento eletrônico faz parte do esforço do Senado para dar resposta firme e racional à insegurança das cidades brasileiras. Quando a razão adormece, geram-se monstros, advertia Goya.Temos de permanecer nessa trilha ditada pela razão e a modernização caso queiramos soluções eficazes para a segurança pública. Afinal, de monstruosidades as nossas ruas já estão cheias.


ALOIZIO MERCADANTE, 52, economista e professor licenciado da PUC-SP e da Unicamp, é senador da República pelo PT-SP.

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